Prezados colegas, passadas as festividades e os afazeres relacionados ao Congresso Internacional de Odontologia de São Paulo (CIOSP) é momento de retomarmos nosso diálogo sobre a especialidade da Odontologia do Trabalho (OT), desejando a todos um novo ciclo repleto de realizações pessoais e profissionais.
Abordar os aspectos éticos que envolvem nossa especialidade é de fundamental relevância, uma vez que é sobre estes fundamentos das relações que se apoiam as variadas atividades humanas, em seus mais diversos segmentos sociais.
Buscando alinhavar a questão conceitual sobre o significado do Etos (lato sensu) em uma sociedade, recorro a uma das mais singelas fontes, no entanto, uma das mais acessíveis, que nos diz: “Etos [Do gr. éthos, ‘costume’, ‘uso’, ‘característica’.] 3.Sociol. Antrop. Aquilo que é característico e predominante nas atitudes e sentimentos dos indivíduos de um povo, grupo ou comunidade, e que marca suas realizações ou manifestações culturais”. (FERREIRA, ABH – 2004)
Uma vez estabelecido este conceito como parâmetro, voltemos nossa atenção ao conjunto multifacetado de características que circundam o exercício da especialidade em questão, trazendo à tona, seus principais aspectos.
Observando-se o que reza o próprio Código de Ética Odontológica (CEO – Resolução CFO 118/2012), em seu Artigo 1º,
o Código de Ética Odontológica regula os direitos e deveres do cirurgião-dentista, profissionais técnicos e auxiliares, e pessoas jurídicas que exerçam atividades
na área da Odontologia, em âmbito público e/ou privado, com a obrigação de
inscrição nos Conselhos de Odontologia, segundo suas atribuições específicas.
fica patente que a ciência e obediência ao mesmo, é dever de todo cirurgião-dentista.
No entanto, quando tratamos dos aspectos éticos que envolvem a Odontologia do Trabalho, sua abrangência é ampliada para além do CEO que norteia a parte das relações éticas com as quais o cirurgião-dentista dedicado à esta especialidade se vê enredado.
Mesmo sendo o CEO um instrumento usado como referência para a conduta e comportamento do profissional comprometido com a saúde orofacial dos trabalhadores, é preciso considerar que as relações com ética empresarial e nas relações transdisciplinares nem sempre podem ser extraídas, ainda que por similaridade, do referido código.
O fato do cirurgião-dentista que presta serviços no âmbito da Odontologia do Trabalho seja no assessoramento e/ou operacionalização da sua prática, especialista ou não, ter acesso às informações cadastrais dos trabalhadores de um determinado segmento produtivo (seja em empresas, sindicatos ou por meio dos serviços públicos), assim como às informações de saúde registradas pelos demais profissionais da equipe de acompanhamento dos trabalhadores, traz consigo, particularidades éticas adicionais às previstas no CEO.
Exemplo destas situações que requerem a atenção redobrada do profissional da Odontologia do Trabalho configuram-se quando do acompanhamento clínico-diagnóstico-orientador (exames clínicos orofaciais e aconselhamento ocupacional), na qual, o trabalhador não se caracteriza, necessariamente, como “paciente” (no sentido de padecimento) e tampouco como “cliente”, uma vez que não é ele o remunerador pelos serviços prestados; disto gerou-se a necessidade de cunharmos o termo “trabalhador examinado”. Desta caracterização, que enseja todas as proteções e cuidados éticos previstos no CEO, o profissional da OT deve atentar para o importante aspecto de que o “trabalhador examinado”, geralmente, também é acompanhado por um(a) outro(a) colega CD, o que o torna um elo na cadeia das relações éticas, entre os profissionais, também previstas no CEO.
No campo da Ética Corporativa Institucional, como mencionado acima, o CD comprometido com a Odontologia do Trabalho, seja no serviço público ou privado, ao acessar informações pertinentes ao trabalhador, fornecidas pelo contratante dos serviços ou diretamente pelo trabalhador, implicitamente assume a responsabilidade no tratamento ético destas informações, sejam de ordem funcionais, sociais, de saúde ou de segurança ocupacional. Exemplos de tais circunstâncias é a manipulação dos dados relativos aos cargos, salários, escolaridade dos trabalhadores, entre outras oriundas dos serviços de Recursos Humanos (RH) ou dos Departamentos Pessoais (DP); da mesma forma, o acesso aos dados da anamnese e histórico de saúde registrado pela Medicina e Enfermagem do Trabalho, assim como relatórios dos acidentes e doenças ocupacionais registrados em relatórios das Comissões de Análise dos Acidentes conduzidas pela área de Segurança do Trabalho e/ou pelas Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPAs) devem ser tratados e usados de acordo com as políticas da instituição e preceitos éticos contidos nas regras de boas práticas corporativas.
Destaca-se, finalmente, a importância da rigorosa observação da Ética da Pesquisa em Saúde, por parte do CD, quando da emissão dos relatórios gerenciais e apresentação dos resultados estatísticos decorrentes dos serviços de acompanhamento e promoção da saúde orofacial dos trabalhadores, zelando para que tais resultados não sejam usados administrativa e socialmente contra o trabalhador individualizado, sem com isso deixar de prestar as informações relevantes para tomadas de medidas promotoras da saúde dos trabalhadores.
Na esperança de ter contribuído para com a ampliação da visão sobre a prática da especialidade da Odontologia do Trabalho, coloco-me à disposição para dúvidas e/ou sugestões de temas transdisciplinares conexos, por meio dos canais de comunicação do Local Odonto.
Abraço a todos!
João Rodolfo Hopp
Cirurgião-dentista. Pós-graduado em Periodontia. Especialista em Odontologia do Trabalho. Mestre em Trabalho, Saúde e Ambiente. Vice-Diretor Científico do Departamento de Odontologia do Trabalho da APCD-ABCD. Experiência de 30 anos como gestor e responsável técnico à frente do Programa de Odontologia Ocupacional, em empresas do setor elétrico paulista.
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