Doenças acometendo a cavidade bucal de crianças não são raras, principalmente na primeira infância. Nota-se que o desconhecimento das causas das lesões bucais e como proceder diante da manifestação de cada uma representam os principais assuntos que preocupam os pais.
O crescimento e desenvolvimento constantes dessa fase, bem como o início do convívio social contribuem para as chamadas doenças da infância. Muitas delas apresentam como manifestação inicial sinais e sintomas intrabucais, que podem, e muito, contribuir para um diagnóstico precoce e um curso menos doloroso da doença.
Dentre as principais enfermidades, destacam-se as infecções fúngicas e virais. Com a aproximação das estações mais frias do ano, é preciso estar atento a essas doenças infecciosas, pois os microrganismos encontram clima favorável para sua propagação. Por outro lado, na primeira infância, temos um sistema imunológico em maturação, entrando em contato inicial com vírus, bactérias e fungos, antes ainda desconhecidos.
Paralelamente a isso, como o contágio se dá, principalmente por meio de aerossóis e pelas mãos, já nos primeiros meses de vida, há a necessidade de se ficar alerta ao aparecimento destas doenças. Nessa fase, uma grande parte das crianças frequenta creches e escolas, ficando em íntimo contato diariamente umas com as outras, muitas vezes em ambientes pouco ventilados. Há também a troca constante de objetos, além do hábito de levá-los à boca e ao nariz, o que facilita a transmissão de microrganismos.
Pode-se destacar como doenças mais comuns na infância e que apresentam lesões bucais: a candidíase, a infecção primária do herpes, bem como outras viroses, como o sarampo, a catapora e a rubéola. Tais males, em geral, não costumam ser graves, mas exigem cuidados, para que não acarretem sequelas ou outras complicações.
Candidíase Pseudomembranosa
A candidíase pseudomembranosa caracteriza-se por uma infecção fúngica, também conhecida como “sapinho”. Muito comum nos primeiros meses de vida, apresenta-se na forma de placas brancas que são removidas à raspagem. São encontradas principalmente na mucosa da bochecha língua e palato, apresentando fundo eritamatoso. Em geral, não apresenta dor, podendo os pacientes apresentar ardência. Pode ser provocada após uso de antibióticos de amplo espectro. O hábito de colocar objetos na boca facilita a sua instalação. A higiene bucal pode auxiliar no tratamento, que se baseia no uso de antifúngicos.
Estomatite Herpética Primparia
Representa a manifestação primária da infecção pelo herpes, sendo mais comum em crianças de seis meses a cinco anos. As lesões bucais são acompanhadas ou precedidas de febre alta (39,4 a 40,5 ºC), gânglios inflamados, náusea, anorexia, irritabilidade, calafrios, mal-estar e artralgia, que podem durar até dois dias. Casos brandos desaparecem em cinco a sete dias (casos mais graves: 14 dias) – sem cicatriz. São observadas vesículas puntiformes e úlceras recobertas por pseudomembrana. A gengiva fica edemaciada, eritematosa, dolorosa e com sangramento. As lesões doem muito, e o tratamento é sintomático e de suporte, baseado principalmente em analgésicos.
Sarampo
O sarampo representa uma infecção viral (paramixovírus) cujo período de incubação dura entre 10 e 12 dias, sendo seu contágio por meio das gotículas de saliva. Os primeiros sintomas antes que o exantema apareça na pele são a presença de secreção nasal, ocular e bronquial, levando a rinite, conjutivite e bronquite acompanhados de febre. Na boca são observadas pequenas manchas branco-azuladas em um fundo eritematoso na parte interna da bochecha e lábios – as Manchas de Koplik. Podem aparecer até 48 horas antes das erupções da pele, o que pode facilitar o diagnóstico. Dura em torno de 10 dias, porém as crianças imunizadas costumam ter sua manifestação mais amena. O tratamento baseia-se no controle dos sintomas.
Catapora
A catapora, também chamada de varicela, é uma das doenças mais comuns na primeira infância. A transmissão de seu vírus acontece por contato direto, ficando incubado por até 14 dias. Uma de suas características é a grande variedade de formato de lesões no mesmo momento. Apesar de não ser grave e de normalmente ocorrer de forma atenuada se a criança tiver sido vacinada, exige alguns cuidados, como o tratamento das próprias lesões (vesículas), que coçam bastante, e se a crianças não estiver com as unhas limpas pode provocar uma infecção por bactéria nas feridas. As lesões bucais podem preceder as cutâneas e assemelham-se à gengivoestomatite herpética primária, sendo vesículas branco-opacas, que se rompem formando úlceras. O tratamento é sintomático, e são possíveis complicações a pneumonia e a encefalite.
Rubéola
A rubéola consiste também em uma infecção viral, contraída por meio de aerossóis, porém não apresenta sintomas prévios antes da instalação do exantema. O sintoma mais frequente é a febre, acompanha de manchas avermelhadas por todo o corpo. Na boca, observa-se o “Sinal de Forchheimer”, que são pequenas elevações discretas, vermelho escuras, em palato mole, concomitantes às lesões cutâneas e duram no máximo 12-14 h. Durante o período em que estiver doente, a criança poderá apresentar dores articulares e pequenas hemorragias na pele. O tratamento também é assintomático.
Além dos aspectos clínicos, os relatos sintomáticos e a história das lesões bucais são fundamentais para um diagnóstico seguro. Deve-se, contudo, ter em mente que esses dados reportados por um paciente infantil não são muito confiáveis, uma vez que a criança tem dificuldade de descrever sensações e detalhes do desenvolvimento das lesões. Cabe aos pais e responsáveis estar atentos não só aos sintomas gerais, mas também aos sinais que podem aparecer precocemente na boca, e indicar um possível diagnóstico, tornando o curso da doença mais tênue.
Rhayany Lindenblatt Ribeiro
Cirurgiã-dentista. Especialista em Estomatologia. Doutora e mestre em Patologia Bucal. Habilitada em Laserterapia. 1º Ten Dent Adjunto da Clínica de Semiologia da Odontoclínica Central do Exército.