Por: Vanessa Navarro
Como sempre bem provocativo, o especialista em Cariologia apresentou o questionamento “Por que dentifrício fluoretado deveria ser utilizado do berço ao túmulo?”.
Com uma plateia atenta às valiosas dicas do renomado profissional, Jaime Aparecido Cury iniciou a apresentação falando sobre o controle da cárie no ponto de vista preventivo e terapêutico. “A lesão cárie só ocorre onde biofilme se forma e permanece por longos períodos de tempo, como nas superfícies oclusais, nas áreas interproximais, ao longo da gengiva e na junção cemento-esmalte”, definiu o professor.
Antes considerada, no século 20, como uma doença bacteriana infecciosa e transmissível, hoje, a cárie ganha nova definição, e passa a ser apresentada como doença biofilme-açúcar dependente. “O açúcar é o principal vilão para a formação de lesão cariosa, pois muda a composição e estrutura dos biofilmes e provoca a desmineralização dental”, explicou o especialista.
De acordo com o cirurgião-dentista, que é professor de Bioquímica e Cariologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba (Unicamp), a cárie não é resultado da deficiência de uso de fluoreto, porém o fluoreto é o único agente que reduz significativamente a velocidade de progressão das lesões de cárie. “Quando os dentes são escovados com dentifrício fluoretado, o controle da doença e da progressão das lesões podem ser feitos simultaneamente”.
Sobre a previsão de surgimento da lesão cariosa, Cury explica que ter essa antevisão é comparável com a exatidão de prever a ocorrência de um infarto agudo do miocárdio. “Não é possível prever a futura existência de uma lesão de cárie em uma criança”.
O dentifrício fluoretado contra a cárie
Existem estudos com mais de meio século mostrando as evidências da eficiência do creme dental fluoretado com mais 1000 ppmF na prevenção de cárie. “Isso mostra que 500 ppmF não é 1000 ppmF”, alertou o palestrante.
O especialista recomenda a escovação com 1000 ppmF logo após a erupção dos primeiros dentes decíduos, sempre com a quantidade recomendada. “Cabe lembrar que com a concentração eficaz de flúor, ou seja, 1000 ppm, a escovação deve ser feita pelo menos duas vezes ao dia. Lembro que durante a fase de dentição mista, é preciso recomendar a escovação transversal”.
A formação e a progressão de lesões cariosas podem ser controladas pela desorganização do biofilme dental e pela escovação com uma pasta fluoretada (com mais de 1000 ppmF). “A creme dental fluoretado na dosagem correta deve ser utilizado do nascimento até a sepultura”, defendeu.
Sobre o fluoreto
Cury denominou a discussão sobre fluoreto como a parte mais neurótica da apresentação. “É preciso ter em mente que o efeito do fluoreto é local. Qualquer fluoreto mantido de maneira constante no meio ambiente bucal tem potencial anticárie. Qualquer fluoreto absorvido pelo organismo e circulando pelo sangue terá potencial de manifestação de algum efeito colateral”.
O especialista apresentou os efeitos sistêmicos do uso de flúor e as evidências para o uso de fluoretos em Odontologia, e citando o médico suíço Paracelso, defendeu: “O que diferencia o veneno do remédio é a dose”.
Fluorose dentária
Denominada como manchas esbranquiçadas presentes nos dentes devido ao excesso de flúor, a fluorose tende a se manifestar durante o período de formação dos dentes.
Tida como único efeito biológico do fluoreto, Cury alertou a todos os participantes sobre a importância de desmistificar os mitos e evidências relacionados às manchas. “Os dentistas deveriam combinar as necessidades de tratamento do paciente com a preferência pela melhor evidência científica disponível”.
O profissional de saúde bucal utilizou a última parte da aula para apresentar slides sobre a prevalência de fluorose dentária no Brasil, e, munido de imagens, intensificou a discussão com a exibição de casos de fluorose muito leve, leve, moderada e severa. “A gente sempre busca um equilíbrio entre a cárie e o açúcar e entre o fluoreto e fluorose. A fluorose está mais na cabeça do dentista do que nos dentes do paciente”, finalizou.
Interessante.